17 de mai. de 2011

Quando Deus aparece (Martha Medeiros)


Tenho amigas de fé. Muitas. Uma delas, que é como uma irmã, me escreveu um email poético, dia desses. Ela comentava, em detalhes, sobre o recital a que ela assistiu do pianista Nelson Freire, recentemente. Tomada pela comoção durante o espetáculo, ela finalizou o email assim: "Nessas horas Deus aparece."

Fiquei com essa frase retumbando na minha cabeça. De fato, Deus não está em promoção, se exibindo por aí. Ele escolhe, dentro do mais rigoroso critério, os momentos de aparecer para a gente. Não sendo visível aos olhos, ele dá preferência à sensibilidade como via de acesso a nós. Eu não sou uma católica praticante e ritualística - não vou à missa. Mas valorizo essas aparições como se fosse a chegada de uma visita ilustre, que me dá sossego à alma.

Quando Deus aparece para você?
Para mim, ele aparece sempre através da música, e nem precisa ser um Nelson Freire. Pode ser uma música popular, pode ser algo que toque no rádio, mas que me chega no momento exato em que preciso estar reconciliada comigo mesma. De forma inesperada, a música me transcende.

Deus me aparece nos livros, em parágrafos em que não acredito que possam ter sido escritos por um ser mundano: foram escritos por um ser mais que humano.

Deus me aparece - muito! - quando estou em frente ao mar. Tivemos um papo longo, cerca de um mês atrás, quando havia somente as ondas entre mim e ele. A gente se entende em meio ao azul, que seria a cor de Deus, se ele tivesse uma.

Deus me aparece - e não considere isso uma heresia - na hora do sexo, desde que feito com quem se ama. É completamente diferente do sexo casual, do sexo como válvula de escape. Diferente, preste atenção. Não quer dizer que qualquer sexo não seja bom.

Neste exato instante em que escrevo, estou escutando "My sweet Lord" cantada não pelo George Harrison (que Deus o tenha), mas por Billy Preston (que Deus o tenha, também) e posso assegurar: a letra é um animado bate-papo com Ele, ritmado pelo rock'roll. Aleluia.

Deus aparece quando choro. Quando a fragilidade é tanta que parece que não vou conseguir me reerguer. Quando uma amiga me liga de um país distante e demonstra estar mais perto do que o vizinho do andar de cima. Deus aparece no sorriso do meu sobrinho e no abraço espontâneo das minhas filhas. E nas preocupações da minha mãe, que mãe é sempre um atestado da presença desse cara.

E quando eu o chamo de cara e ele não se aborrece, aí tenho certeza de que ele está mesmo comigo.

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Esse texto é de Martha Medeiros e  foi publicado na Revista de Domingo, do Jornal O Globo, em 24/08/2008.
Esse texto é um dos meus textos favoritos e me comovi muito quando li pela primeira vez!!!

15 de mai. de 2011

Labirinto



Labirinto
Estou em um labirinto, no meio de um deserto, tentando achar a saída, mas ao mesmo tempo com medo de encontrar e ter que sair para o deserto... O deserto hipnotiza, mas também desespera. Eu não sei se prefiro ser hipnotizada ou me desesperar...
O labirinto está me sufocando, está encolhendo, e eu não quero mais ficar!!! Mas “esse não quero” ainda não está forte o suficiente para eu vomitar. Ele ainda é uma contração meio que involuntária que às vezes vem com tudo, mas muitas vezes não vem com nada...
Quando chego perto da saída do labirinto, eu paraliso, não consigo sair do lugar... A minha mente sai sempre, mas o meu corpo não acompanha...
Eu tenho medo de ficar no labirinto para sempre e virar apenas um esboço malfeito. Tenho medo de ser apenas uma possibilidade e nunca uma realidade... Tenho medo de não ser a mulher que eu sou aqui dentro da minha cabeça, aqui dentro do meu ser.
Eu estou me desperdiçando e tenho medo de não sobrar nada para depois...
Eu estou me debatendo aqui dentro. Eu quero sair!!!
Eu sou o meu labirinto, eu sou o pior labirinto que eu podia ser. Porque neste labirinto ninguém pode me ajudar...

Texto escrito em 24/01/2010

14 de mai. de 2011

Dia Internacional da Mulher

Este texto foi feito para um concurso do Jornal ao Globo sobre o dia Internacional da Mulheres de 2011.

A minha redação foi uma das 30 escolhidas e como prêmio tive direito a participar de um encontro com a escritora Martha Medeiros, na Casa do Saber, no Rio de Janeiro. Eu sou muito fã dela e fiquei muito feliz!!!




Dia Internacional da Mulher
Confesso que até ontem eu me questionava sobre a validade de existir o Dia da Mulher. Na verdade eu até considerava esse dia um tipo de preconceito e discriminação e não entendia termos “um dia” para a gente.

Porém hoje pela manhã ouvi na televisão que a origem desse dia está associada a um incêndio que houve em uma fábrica em 25 de março 1911, no qual a maioria dos trabalhadores mortos eram mulheres costureiras.

Segundo a Wikipédia a origem desse dia é bem mais complexa do que esse evento isolado... O fato é que o que ouvi na televisão e o que li a respeito me fizeram repensar a minha opinião e humildemente concordar que esse dia é sim muito importante e tem um simbolismo forte e necessário. Ele exprime anos de sofrimento e injustiças sofridas pelas mulheres, que infelizmente não podemos considerar que ficaram no passado.

Apesar de toda a independência e conquistas que nós mulheres conseguimos ao longo desses anos, temos que concordar que ainda existe preconceito contra o sexo feminino.

É claro que hoje, em algumas partes do mundo, esse preconceito é sutil e disfarçado pela modernidade e pelos avanços do mundo. Já em outras partes ele continua ostensivo e legitimado por razões incompreensíveis e totalmente contestáveis.

Não preciso de muito tempo para pensar em um exemplo clássico de discriminação da modernidade, pois me vem logo à mente o mercado de trabalho em que a mulher ganha um salário menor que o do homem, mas em compensação tem uma carga horária e uma cobrança por desempenho igual ou até maior que o masculino. Isso é quase inacreditável, mas é a mais pura realidade.

Quando penso nas outras partes do mundo onde não existe sutileza nenhuma no preconceito contra a mulher, também é fácil e rápido achar exemplos. Em países da África até hoje existe a mutilação da genitália feminina, mais precisamente do clitóris, com o propósito de evitar o prazer da mulher. Mais triste ainda é na China, onde encontramos um índice altíssimo de abandono de bebês meninas.

Pensando em tudo isso, precisamos e muito do Dia Internacional da Mulher para celebrar todas as conquistas alcançadas, que com certeza não são poucas e nem foram fáceis de conquistar, pois o preconceito muitas vezes vem de onde menos se espera. Não raro as próprias mulheres são a fonte desse preconceito. Isso não é exagero. Tenho certeza de que se você pensar um pouco vai identificar alguém do seu círculo de convivência que se encaixa perfeitamente nesse papel.

Também precisamos desse dia para continuar conscientizando o mundo de que ainda há muito que se fazer para erradicar esse preconceito e subjugação retrógrados que não têm o menor sentido, uma vez que somos todos de uma única raça: nós somos seres humanos, e é essa a incontestável verdade absoluta.


Rio de Janeiro, 07 de março de 2011

Leite Derramado

Cansei de pensar no leite derramado... Vou sair para viver!!! Rosane Liporace